
Eu não sei você, mas, por mais que eu tente negar esse traço em mim, me sinto uma pessoa (um pouco, às vezes muito) controladora. É horrível, eu sei. Você deve estar lendo essa parte fazendo uma careta. Mas é isso: a maturidade nos faz reconhecer (se quisermos, claro) alguns traços não tão saudáveis em nós mesmos.
Mas, cá entre nós, se cavucar um pouquinho aí, você também é, em algum grau, uma pessoa que gosta de manter o controle. Não concorda? Tudo bem, eu estou tentando aprender que não tenho controle sobre tudo mesmo. (risos)
E eu sei — e talvez você também saiba, lá no fundo — que a gente não tem controle de absolutamente nada na vida. Você pode planejar algo do começo ao fim, criar um ponto de partida e de chegada, mas, entre esses dois pontos, existe o meio. E esse meio, meus amigos, muitas vezes pode ser caótico.
“Eu mudo, nós somos mutáveis, o mundo é mutável. A única coisa que nunca vai mudar é que tudo muda o tempo todo." — Emmanuel Carrère
Porque a vida é isso: ela é dinâmica e adora mudar nossos planos. Gosto de me imaginar no Rally Dakar, sendo a motorista, e minha vida como a navegadora. Ela fica mudando rotas, querendo pegar atalhos, me colocando em caminhos mais longos. A gente passa juntas por obstáculos e, em alguns momentos, uma grita para a outra:
— Para onde eu vou?
— Vira para a esquerda!
— É a outra esquerda!
— Pois é, estamos perdidas!
(Pausa nada a ver no assunto, mas fui pesquisar sobre o Rally Dakar porque fiquei curiosa.)
O Rally Dakar foi criado em 1978 pelo motociclista francês Thierry Sabine, que se perdeu no deserto durante outro rali e foi resgatado dias depois.
E assim confirmo minha teoria — tirada totalmente da minha cabeça — de que o meio é caótico. O cara tinha um ponto de partida e um de chegada, mas, no meio, as coisas mudaram de direção (literalmente). Ele se perdeu no deserto do Ténéré, no Saara, e passou alguns dias vagando até ser resgatado. Depois dessa experiência, ficou tão fascinado pelo deserto que decidiu criar um rali que atravessasse paisagens extremas. Assim nasceu o Paris-Dakar, que depois virou o Rally Dakar.
Dizem que ele ficou vários dias desaparecido, e ninguém conseguia encontrá-lo. A parte do resgate é meio incerta porque estamos falando de algo que aconteceu na década de 70, ou seja, sem GPS ou internet para ajudar nas buscas. Algumas fontes dizem que ele foi encontrado por uma expedição de resgate, outras afirmam que um piloto de avião que passava por lá o avistou.
Eu realmente estudaria esse cara, porque, né? Ele se perdeu no deserto, quase foi de arrasta pra cima e, quando voltou, pensou: "Acho que vai ser uma boa ideia voltar para o deserto e fazer várias corridas por lá."
(Fim da curiosidade sobre o Rally Dakar. De nada!)
Mas por que estou falando tudo isso? Porque me propus a praticar yoga e meditação todos os dias. Meu ponto de partida foi 1º de janeiro, e meu ponto de chegada será 31 de dezembro. Tenho 365 dias (se o ano não for bissexto) para cumprir isso, e, nesse meio, alguns dias serão desafiadores, outros eu vou pular — e sigo tentando conviver com o meio desse planejamento.
É aquela analogia de subir uma montanha. Para criar um hábito dentro da cabeça, você vai subir uma montanha íngreme. E, com essa meta, eu realmente estou subindo uma. O começo pode parecer interminável. Olhar para o cume, em alguns dias, é desanimador. E, como toda montanha, há obstáculos pelo caminho. Em alguns momentos, vou ficar cansada e são nesses dias que não quero praticar ou me pergunto por que decidi fazer isso, já que poderia simplesmente ficar mais tempo deitada na cama. Mas são esses dias que me forço a subir no tapetinho. Às vezes, a prática vira só um alongamento — e está tudo bem.
Assim como haverá dias em que vou pegar chuva nessa montanha e acordar nublada, como também haverá dias em que vou acordar ensolarada, cheia de energia, fazer as práticas com alegria e distribuir namastês por aí o dia todo.

Este é o primeiro ano em que, de fato, insiro a meditação nessa meta, pois desde 2020 venho tentando manter uma prática de yoga por dia. Ainda é um processo de autoconhecimento (talvez um processo que nunca vá terminar), acompanhado de uma mente barulhenta. Mas eu fico lá, sentadinha, os 10 minutos que me propus a fazer.
Estou nessa desde o dia 1º de janeiro, e escrevo este texto na metade de março. Já pulei alguns dias, mas minha única regra é: não pular dois dias seguidos. Já fiz práticas sem dar a mínima, assim como já fiz outras que foram muito significativas para mim.
Sim, vai ter chuva de citações do livro Ioga, porque o autor fala sobre isso, sobre alguns dias em que a prática acontece no automático.
"Nos dias bons, ao fazer isso, nos sentimos como um animal que se alonga. Nos menos bons, nos refugiamos na rotina, nos padrões, nas preferências — é melhor que nada."
E eu ando seguindo isso: é melhor que nada. Se você perguntar para um praticante de meditação e yoga, ele possivelmente faz uma prática de mais de uma hora. Eu tenho meus 20 minutos para dividir entre yoga e meditação. É pouco? Talvez. Mas é o que consigo no momento? Sim! Então, é melhor que nada.
O autor mesmo escreve no livro que o melhor a se fazer é trabalhar com o que se tem. Eu tenho esse tempo, então estou trabalhando com o que tenho.
E já senti diferenças. Comecei a meditação com 7 minutos. Depois de umas duas semanas, percebi que 7 minutos eram só o tempo necessário para ultrapassar a primeira onda de pensamentos mais pesados. Minha mente ainda estava se acostumando a ficar parada, apenas observando. Era barulhento. Com o tempo, entendi que, para mim, a meditação acontece depois dessa “quebra de onda”. Agora faço 10 minutos e já sinto a necessidade de aumentar. Parece que minha mente agora me diz: "E se a gente for um pouco além, o que vamos encontrar?"
Talvez essa seja a lógica dos exercícios físicos: você começa levantando um peso de 2 kg e, depois, seu corpo começa a pedir mais carga.
Claro que, às vezes, a mente fica agitada, gritando coisas, querendo outro tipo de atenção. Aí, sigo meu mantra: "Você está aqui!" e foco na respiração.
Porque é essa a revolução, uma das revoluções da meditação. Em vez de encarar com animosidade os pensamentos de que não nos orgulhamos tanto, em vez de buscar erradicá- los, nos contentamos em observá- los sem fazer drama. Porque eles existem, porque eles estão bem aqui. Nem verdadeiros nem falsos, nem bons nem ruins: microacontecimentos psíquicos, bolhas na superfície da consciência. Se os olharmos assim, mesmo sem nos darmos conta eles perdem seu poder e deixam de ser nocivos. Não julgar seus próprios pensamentos, assim como não julgar ao próximo. Tomá- los pelo que são, vê- los como eles são. Sim, essa é uma terceira e talvez a definição mais precisa da meditação: ver os pensamentos como eles são. Ver as coisas como elas são.
Comecei a praticar yoga em 2015, quando fui sozinha a um grupo de Yoga ao Ar Livre no Parque da Juventude, em São Paulo. Lembro da Giselle de 2015, meio solitária, sem saber o que buscava ali. E, naquela primeira prática, parecia que uma peça se encaixou dentro de mim. Fez tanto sentindo para mim, que desde então, nunca mais consegui abandonar a yoga por muito tempo.
Ainda participo do grupo, mas esse ano, decidi entrar nessa jornada só comigo mesmo.
Mas recomendo, se é algo que você vai começar agora, tente primeiro fazer com grupo e se for ao ar livre, melhor ainda, é outra experiência. Procure pela sua cidade, provavelmente terá alguma opção de praticar em grupo.
Se você chegou até aqui e quer experimentar yoga ou meditação, há muitos recursos disponíveis por aí. Você pode começar com aulas gratuitas no YouTube ou aplicativos que auxiliam na meditação. No final do texto, deixei algumas sugestões.

Emmanuel Carrère é um autor francês já famoso, consagrado, com uma carreira muito bem construída. Um praticante de yoga, meditação e tai chi há muitos anos, que decidiu escrever um livro sobre yoga — e deu tudo errado.
Acho que é por isso que gostei tanto desse livro. Porque ele tem um plano, um ponto de partida e um de chegada: escrever um livro e pronto. Mas, no meio do caminho, dá tudo errado, e ele se questiona até sobre as ferramentas que conhece e usa há anos. Achei um livro sincero e honesto sobre processos que, no começo, parecem simples, mas, quando a caminhada começa, os obstáculos e desvios aparecem.
Acima de tudo, para mim, esse livro é sobre aceitação. E como é difícil aceitar as adversidades e tentar lidar com elas da forma que conseguimos, sem lutar contra. É meio que deixar o rio fluir, mesmo quando ele está turvo e cheio de galhos.
(E eu só nas analogias com natureza!)
Recomendo muito esse livro, e recomendo também o episódio do meu podcast que eu conto um pouquinho sobre outra coisa que o autor fala no livro, que é trabalhar com o que se tem.
Enfim, eu fico por aqui.
Escute o podcast!
Até a próxima =)
Dicas:
Yoga (para iniciantes)
Aula presencial gratuita (São Paulo)
YouTube (aulas gratuitas):
Meditação (para iniciantes)
Seu texto sempre sensacional, muito obrigado.